1.
Te vejo a apenas alguns metros de distância. Proximidade mentirosa alimentando esse silêncio grosso e intransponível como um muro de concreto. Me divirto curiosamente observando as pessoas. O que você diria sobre a mulher histérica ali ao lado? O que diria sobre essas pessoas encenando todos os dias esse teatro estéril repetindo a mesma sopa de letrinhas e palavras que nada dizem?
Mas você não diz nada.
2.
Você passa por mim com o rosto crispado. Estou próxima a janela como quem espera. Em silêncio, você se dirige novamente à sua mesa onde escreve um inventário de palavras desconexas. Os cômodos jazem silenciosos pela casa. São onze horas da manhã e, até que o dia termine, você ainda há de passar três ou quatro vezes por aqui.
Mas você nada dirá.
3.
Ele entra no quarto e a vê, nua, deitada no chão. De lado, o braço formando um ângulo e sustentando o rosto com a mão. O resto de sol do fim da tarde penetra furtivamente pela rede e vai deitar sobre ela a luminosidade apagada de um dia que se põe. Ela tem o rosto marcado por 2 lágrimas. Ele não as vê mas compreende sua tristeza pela postura do corpo, pelo longo silêncio, por aquela cor avermelhada que é como a dor do sol quebrando o azul.
Quer confortá-la.
Mas ele não diz nada.