quarta-feira, maio 31, 2006

À Espera

Disse que me ligaria às nove. Sentei-me à mesa do escritório e esperei. Fiquei por minutos observando os algarismos efêmeros do relógio digitalizando a minha espera. Faltavam quinze minutos para às nove. Era cedo ainda. Mas eu inteiro me concentrava na espera. Esperar era tudo que eu poderia fazer...
À medida que a hora combinada se aproximava, eu ficava mais nervoso. A tensão percorria todos os músculos da minha face e pesava sobre meus ombros. Depois pensei: ela não ligará às nove em ponto. Vi os dois últimos algarismos se transformarem então e a hora combinada chegou. Fixei os olhos no telefone imóvel. A tensão chegou a um nível máximo e depois de alguns segundos se dissipou. Sim, ela não ligaria exatamente às nove, pensei.
Estaria ela, neste momento, contabilizando os minutos sensatos que deveria esperar para que não fosse extremamente pontual? Ao pensar nisso concluí que telefonaria às nove e quinze. E então pus-me a esperar. Esperar era tudo que eu podia.
A nova hora chegou. E de novo mirei o telefone. Ele continuou impassível ao meu desespero. Mudo. Sombrio. Misterioso. Do outro lado da linha, que linha?, havia alguém, ou não haveria?!
Então me distraí com os livros sobre a mesa. Abri um a esmo, li algumas linhas. Linhas sublinhadas tortuosamente a lápis. Reconheci minha grafia de muito tempo. Abri outro e mais outro. As linhas se repetiam e já nos livros mais novos não havia. Ainda não li este, pensei. E a curiosidade de ler a última linha me invadiu novamente como quando eu era criança. Não lerei, resisti. Olhei de novo o relógio. Controlava-me o relógio. O tempo me mirava. Havia transcorrido então trinta preciosos minutos de espera. Esperar... Eram nove e quarenta e cinco da noite.
Abri um livro de poemas. Sempre me prometi uns estudos de estilo que nunca realizei. Preciso organizá-los pensei. Posso fazer isso enquanto espero. Então levantei-me, com algum custo então, porque o peso da espera se acumulou em minhas pernas, e arrematei alguns livros na estante. Alguns tinham notas de rodapé, outros dobraduras e outros ainda, clipses. Quantas vezes comecei isso antes? Não importa. Começar. Apenas começar. Organizei os livros, reli meus poemas preferidos. Invejei as frases que jamais comporia.
Olhei de novo o relógio. Mais meia hora. Eram dez e quinze da noite. Um pouco mais, eu pensei. Esperar era tudo. Talvez tenha se atrasado, ocorrido algum imprevisto. Imprevisível, pensei. Este telefone está prestes a tocar, sei disso há mais de uma hora e mesmo assim, quando ele tocar, levarei um susto. Agora então não conseguia relaxar. Os algarismos sonolentos do relógio zombavam de mim, de minha espera. Moviam-se com lentidão. Então fixei meus olhos neles. Naquele arrastar incansável das horas. E fiquei assim por muito tempo. Até que despertei de repente daquele entre-sono em que me encontrava e passava de meia noite. A rua silenciava lá fora o fim de mais um dia. Um longo dia de espera. Alguns cachorros começavam a latir solidários na madrugada. Passava de meia noite.
Foi então que eu compreendi: ela não ligaria.

quarta-feira, maio 24, 2006

Uma Manhã Gelada de Julho

Você vinha só sem subterfúgios. Vinha com aquele sorriso no canto dos olhos. Como sempre viera, da maneira que eu o esperava.
E assim, de te olhar e te sentir aproximando-se eu sorri. Sorri porque soube com o meu coração que era o tempo. É agora, pensei. Pensei sem palavras daquela maneira que eu tento explicar mas você ri e eu me calo. Mas foi assim embora você não entenda. É agora, pensei assim sem as palavras. E então você veio sorrindo - era uma manhã gelada de julho mas o sol brilhava tímido. Pouca coisa nos aquecia. Mas era amor aquilo.

sábado, maio 06, 2006

Da Delicadeza

Oferece-me esta rosa que seguras. Dá-me algo que te faça falta mas que o contentamento da generosidade recompense. Aprende a ser menos por si e passa a ser mais pelos outros. Também. Às vezes.
Não dói amar até que nos doa o próprio peito. Porque amar é sempre essa dor delicada. Desejada. Deliciosa.
Aprende a ler nos momentos as alegrias desse cotidiano efêmero em que vives. Transforma. Renova.
Aproveita...
Entrega-te.