quinta-feira, junho 22, 2006

À Espera

II

É cedo ainda. O sol vem me chamar na cama ainda bem cedo nesse sábado. Abro os olhos como se estivesse desperto desde o dia anterior. Olho pela janela. Observo o movimento da rua sábado de manhã. Os sons. Crianças no colo dos pais, embrulho de pão, frango assado da padaria. Faz fila na padaria. Mas o sol ofusca meus olhos que dormiram pouco fazendo-os arderem. Fecho as cortinas.
Fica tudo escuro aqui dentro. Mais escuro do que já vem sendo. Passo os olhos de relance pelo telefone. Nem espero mais que toque, ruja, lata ou emita qualquer som. Tenho certeza de que emudecerá. Hoje, no fim da tarde, quando ela ligar, vou fazer as pazes com o telefone. Mas ainda é cedo e eu já não espero.
Sento-me no sofá, tento ler. Florentino Ariza ainda espera Fermina Daza tantos anos depois. Esperar, esperança, espera. Fecho o livro. Já não quero saber dessas tolices.
Olho o pão duro sobre o fogão. Resolvo sair. Calço meus chinelos e, só então, percebo como meus pés me doem. Passei o dia todo de sapatos calçados aguardando alguém que não viria, que não ligaria. Sinto raiva de mim. Por que ainda acreditar? Pego minhas chaves e saio. Lá fora tudo está alegre. Algumas poucas crianças andam de bicicleta na minha rua. Ando até a esquina, atravesso uma rua perpendicular à minha. Entro na padaria, olho para a moça do caixa e de repente não sei o que dizer. Volto para o final da fila. Dois pães franceses, por favor. Dou o dinheiro, recebo meu troco. Pego o embrulho e saio, ainda disperso.
De volta à casa, não sei o que fazer com um dia inteiro pela frente não planejado. Um dia inteiro para imaginar onde estaria e não estou. Até o sol vai desistindo lá fora e o frio vai tomando conta da casa. Olho a pia da cozinha: sequer tenho uma louça por lavar que ocupe meus pensamentos. Ou, pelo menos, minhas mãos. Maria deixou tudo com cheiro de limpo e um bilhete: "tem carne na geladeira". Preparo um café forte e sento-me à mesa. Ficarei aqui esperando o dia a escoar?
Passo manteiga no pão ainda quente. Tudo demora. O dia demora. A vida demora como se estivesse suspensa. Fico angustiado. Como se saber que vou viver as próximas horas nessa espera negada fosse um anúncio de morte.
Tomo meu café sem alegria. Resolvo voltar ao livro e leio até o meio da tarde quando a fome e a lembrança da carne na geladeira me tiram a concentração. Olho o relógio e felicito-me: passaram-se horas. Esquento a comida e me sinto triste, solitário nesse apartamento. Sequer convivo com Maria, sei de seus filhos, exatamente onde mora, o que faz quando não está aqui. Ela chega quando estou quase saindo e vai embora antes que eu retorne. Sequer converso com Maria. Sequer sei de suas necessidades. Esse pensamento estranho me perturba.
Sento-me à mesa e almoço só, como em todas as tardes de sábado. Lavo a louça bem comportado, enxugo os pratos. Então o telefone toca. Fico paralisado por alguns segundos. Depois enxugo as mãos no pano de prato colorido. Sento-me no escritório: "Alô?". Ela me sorri do outro lado. Desculpa-se brevemente por não ter ligado no dia anterior como combinado, diz simplesmente: "não deu". Como se pudesse amenizar toda a minha espera. Sorrio de volta e passo as mãos pelos cabelos, sorrindo, bobo. Ela parece ter tanto a me dizer...

Você conhece o Movimento inVerso?

domingo, junho 18, 2006

Fred - A Sexta Estrela de Teófilo Otoni

Fui assistir ao jogo na casa de uns amigos mineiros. Um deles é de Teófilo Otoni, quase Bahia, o que lhe confere um sotaque um tanto quanto... particular. Eis que parte da família está lá e foi ótimo conhecê-los. O primeiro tempo foi aquilo: deu pro gasto. Como o narrador gostou de repetir no jogo anterior "o importante é ganhar". Em se tratando de jogo de copa, não vamos discutir.
Então, no segundo tempo, mais precisamente faltando uns 5 minutos pra acabar o jogo eis que o técnico faz uma substituição e entra o jogador Fred. O pessoal de pronto subiu no sofá e começou a pular: "Fredão! Fredão! Fredão!". Fiquei refletindo alguns instantes sobre minha ignorância futebolística num momento tão importante: "Quem diabos é Fredão?!". Ora, Fredão é a sexta estrela de Teófilo Otoni, vejam vocês, embora tenha sido dito que ele gosta de mentir que é de BH. Fredão entrou em campo e foi logo marcando. Depois perguntado pela jornalista se ele tinha estrela, disfarçou, foi humilde, disse que a bola foi parar nos pés dele, e foi mesmo... Mas Téofilo Otoni sabe que Fredão tem muita estrela...

É Domingo É Domingo É Domingo

Então...
Cecília começa sua história e me conta o que tem feito
no Rio de Janeiro.
Adélia adora o Rio, me diz:
"Acho o Rio de Janeiro uma beleza".
Sim, eu sei. Digo.
Também estes versos me guardam.
Ou guardo eu a eles?
Marcelo me conta coisas.
Várias novidades.
Agora é uma tarde de domingo e ainda tomamos café na mesa.
Café forte e pouco açúcar.
A casa está cheia.
Mas ali na cozinha
somos só nós.

segunda-feira, junho 12, 2006

Procurando encontrar é que perco

Que fazes destas palavras?
Apenas invólucros de teus pensamentos.
Abre, despetala, desembrulha.
Desfaz, aos poucos,
porque tudo cansa,
esse labirinto insano que criaste.
Estou aqui
estou te ouvindo.
Mas já não sei por quanto tempo.

sexta-feira, junho 09, 2006

quinta-feira, junho 08, 2006

"Agitos" da Semana

Essa semana começou super bem com a palestra da Adélia Prado na Letras & Expressões em Ipanema. Fiquei sabendo em cima da hora, corri pra lá e quase não consegui entrar. Mas entrei. Entrei e fiquei segurando as lágrimas nos olhos enquanto Adélia discorria, em seu mineirismo firme, sobre a paixão pela palavra. Cheguei já na hora das perguntas. Mas não me perguntem sobre o que ela disse. Fiquei tão emocionada que nem sei... Só guardei o som da sua voz recitando simples "O Casamento": "Coisas prateadas espocam: somos noivo e noiva".
Terça foi o dia de resistir ao dia em si e ir assistir Los Hermanos no Circo. Foi ótimo, apesar do cansaço que agora eu estou sentindo. :) Show animado como sempre e o público cantando do início ao fim. Muito bonito. Eu e Pe adoramos!
E sexta tem Movimento inVerso! Do meu amigo Alexis Sauer. Essa semana é sobre Poesia Erótica. Na rua Vinícius de Moraes, 190 apto 3 em Ipanema. A entrada é 5 reais e no final todo mundo pode dar sua canjinha... :) Parece ótimo!

domingo, junho 04, 2006

A Palavra nos Enlaça

Ontem, sábado à noite, fui ver o pessoal da Escola Lucinda de Poesia Viva se apresentar na Renovar em Ipanema. O Recital foi sobre Mario Quintana - o poeta passarinho... E além das lindas palavras ditas por lá foi bom também reencontrar alguns colegas da turma do Workshop: Natália - linda, linda de cabelinhos curtos, Nelson, Leila, Henrique (ei! será que o Bagunçando não volta mesmo? hunf...) e Alexis que anda por aí organizando altos eventos. Aliás, assim que ele me mandar a divulgação oficial da coisa eu publico aqui.
Por enquanto, fica o poema abaixo na minha memória com a voz firme da Claudia:

De gramática e de linguagem

E havia uma gramática que dizia assim:
“Substantivo (concreto) é tudo quanto indica
Pessoa, animal ou cousa: João, sabiá, caneta”.
Eu gosto é das cousas. As cousas, sim!...
As pessoas atrapalham. Estão em toda parte. Multiplicam-se em excesso.
As cousas são quietas. Bastam-se. Não se metem com ninguém.
Uma pedra. Um armário. Um ovo. (Ovo, nem sempre,
Ovo pode estar choco: é inquietante...)
As cousas vivem metidas com as suas cousas.
E não exigem nada.
Apenas que não as tirem do lugar onde estão.
E João pode neste mesmo instante vir bater à nossa porta.
Para quê? não importa: João vem!
E há de estar triste ou alegre, reticente ou falastrão.
Amigo ou adverso... João só será definitivo
Quando esticar a canela. Morre, João...
Mas o bom, mesmo, são os adjetivos,
Os puros adjetivos isentos de qualquer objeto.
Verde. Macio. Áspero. Rente. Escuro. Luminoso.
Sonoro. Lento. Eu sonho
Com uma linguagem composta unicamente de adjetivos
Como decerto é a linguagem das plantas e dos animais.
Ainda mais:
Eu sonho com um poema
Cujas palavras sumarentas escorram
Como a polpa de um fruto maduro em tua boca,
Um poema que te mate de amor
Antes mesmo que tu saibas o misterioso sentido:
Basta provares o seu gosto...

Mario Quintana

Leituras

E o que eu sei ler de ti, meu amigo?!
Pouco, muito pouco...