quarta-feira, setembro 06, 2006

Ponto de Interrogação

"Desfaz o vento
o que há por dentro
desse lugar
que ninguém mais pisou."
Nando Reis e Samuel Rosa


Eduardo mira os olhos enrugados pelos 42 anos de Carmem. Não diz nada... Apenas mira. Carmem enxerga as interrogações no olhar de Eduardo. Ele espera uma resposta?
Na poltrona, Antonio assiste TV e lê o jornal de domingo atrasado. Carmem passa um café para eles. A tarde cai e a noite vai recolhendo os vestígios do que foi um dia frio e ensolarado. O olhar de Eduardo ainda interroga.
Carmem traz o café, serve Antonio. À mesa, Eduardo se serve. Carmem se senta na cabeceira da mesa porque Antonio continua sentado na poltrona. Distante. Às vezes, ri ligeiro e comenta alguma das notícias que lê. Carmem observa triste. Antonio nada interroga. As crianças passam correndo para o quarto pois têm seus próprios programas para ver. Antonio não repara. Carmem vai à cozinha a pretexto de levar as canecas mas quer esconder uma lágrima. Carmem olha pela janela e chora. Pensa em Antonio, nas crianças, pensa em Eduardo. Não foi educada para essas respostas. Não tem respostas.
Quando finalmente volta à sala, Eduardo já se prepara para ir. Ele ainda a olha por um instante. Carmem abaixa lentamente a cabeça e Eduardo sabe que o gesto que poderia ser um sim pela metade é um não. Pega suas coisas, despede-se de Antonio e sai.

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