sábado, dezembro 29, 2007

Novo

"A vida é a arte do encontro embora haja tanto desencontro pela vida"

Vinícius de Moraes

Balanço (Multimídia) de Final de Ano

Como sempre... os melhores do ano... :)

Livros:

- Olhai os Lírios do Campo (Érico Veríssimo)
- Incidente em Antares (Érico Veríssimo)
- O Ano da Morte de Ricardo Reis (José Saramago)
- História do Cerco de Lisboa (José Saramago)

Filmes:

- Little Miss Sunshine
- Scoop
- O Cheiro do Ralo
- Meu Melhor Amigo
- O Labirinto do Fauno
- Ponte para Terabítia
- Não por Acaso
- Tropa de Elite
- O Passado
- Viagem a Darjeeling
- A Vida dos Outros

Shows:

- Los Hermanos
- Nação Zumbi

Música (CD's que eu mais ouvi):

- I Am a Bird Now (Antony and the Jonhsons)
- Fome de Tudo (Nação Zumbi)

terça-feira, dezembro 18, 2007

Sapatos Vermelhos

III

Ela teria beijado o primeiro que tentasse. Naquela noite, perdida na multidão antes que começasse o show. Trazia um copo de plástico na mão, o vinho já esquentando naquela noite tão fria. Tentou arrastar alguém consigo, não conseguiu. Pediu a um amigo que fosse com ela, ele não foi. Falou com outras pessoas... Ninguém. Seria possível que ninguém do seu convívio gostasse da banda mais pop de que ela gostava? Pois então... Sozinha na cidade, resolveu ir mesmo assim. E foi. Não estava acostumada a beber de modo que o vinho a pegou logo no primeiro gole. E foi aí que resolveu não resistir... Mas ninguém veio falar com ela... Com o copo na mão, um pouco atônita tentou vasculhar em si mesma o que a fazia tão pouco atraente... Olhou para os sapatos vermelhos... Certamente não eram eles... Pelo menos emprestavam um certo quê de interessante... Talvez a calça jeans já gasta, de um modelo ultrapassado. Certamente, que calça era aquela?! Porque ainda guardava aquele trapo? O jeans já claro pelos longos anos de uso, um pouco apertado nos quadris e na bunda... porque tinha engordado alguns poucos quilos... E a camiseta branca? Completamente lisa... Nada por dizer, nenhum estilo para afirmar... Pensou nos colegas do trabalho reclamando de suas mulheres frescas, consumistas, hiper-maquiadas... Não estava maquiada... não era fresca e sequer usava as roupas da moda... E portanto, não havia ninguém que olhasse para ela. Soltou uma gargalhada enquanto elaborava o pensamento tortuoso. Derramou um pouco de vinho na areia... A tinta colorindo o chão. Achou aquilo bonito, pôs os pés calçados de vermelho ao lado - alguma coisa combinava pelo menos. Nenhum brinco, pulseira, anel, relógio, tatuagem de estrelinha no ombro, piercing nas sobrancelhas... Nada. O show de abertura começou e ela não percebeu. Olhou pro lado porque notava um olhar forte em sua direção mas o menino bonito de blusa azul olhava através dela. Neta de vidraceiro, pensou, continuo transparente...
Quando virou pra frente viu um outro rapaz conversando com uma menina... Linda... toda arrumada como ela jamais saberia imitar, nem que tivesse todos aqueles acessórios. Deixou uma lágrima pular dos olhos enquanto tentava sorrir. Jogou o resto do vinho fora na areia da árvore já manchada. Caia uma chuva fina e os primeiros acordes da banda principal já podiam ser ouvidos. Se aproximou do público. Um homem de meia idade acompanhado de uma amiga convida: ei, você não vai assitir ao show sozinha, vai? Fica aqui com a gente. E ela ficou.

terça-feira, novembro 27, 2007

Página em Branco

Eu revirei tuas páginas
até encontrar as palavras
que falavam de mim.
Desencapei teu livro
em busca de uma dedicatória
qualquer
em vão:
só havia silêncios.
Reli todas as notas
do autor
e do revisor.
Não havia respostas. Não havia entrelinhas.
Procurei nos índices e nos anexos.
Nada.
No livro desbotado e amarelecido de tua vida
nenhuma palavra sobre mim.

domingo, novembro 18, 2007

Sapatos Vermelhos

II

Dou uma topada com o pé esquerdo na perna da cama. A lágrima pula teimosa do olho.
Atrasada, entro no banho e não consigo regular a temperatura: ferve de raiva ou gela de solidão a água. Me enxugo já sem paciência. Tem dias que nem ficar triste cai muito bem.
Procuro a escova pela casa e não acho, saio com os cabelos desgrenhados pelo corredor.
Pego uma chuva pelo caminho que estraga a pequena alegria da camurça vermelha de meus sapatos novos. Não há de ser nada - tento me consolar mentalmente.
Pego o ônibus cheio e cansado... Vou sacolejando por mais de uma hora e meia num trânsito sem precedentes para o horário. Depois de dois pisões no pé e um guarda-chuva molhado que destruiu o livro que eu trazia nas mãos, recebo uma cotovelada na cabeça, logo antes de saltar. Os sapatos vermelhos pisam a areia da calçada. Olho a praia em frente, o prédio... Quase não hesito. Atravesso a rua por entre os carros engarrafados, corro em direção à água, jogo o livro na areia e me sento observando as ondas...
Passo a manhã sob a chuva fina e o ar úmido que vem do mar. As ondas entoando como um mantra.
Olho mais uma vez para os sapatos destruídos antes de atirá-los ao mar...
Não há de ser nada.

terça-feira, novembro 13, 2007

Sapatos Vermelhos

I

Ele abriu lentamente a porta e entrou no quarto. Trazia um ramalhete de flores do campo que colocou num copo de plástico ao lado da cama levemente erguida. Olhou triste para o soro que pingava como um conta gotas. Ela abriu os olhos. Não dormia, afinal. Tentou sorrir. Ele retribuiu o que pensou ser um sorriso. Quero ver a praia, ela disse. Vinha pedindo há dias. O coração dele se machucava a cada vez que ela pedia. E se ela não vivesse muito mais? Valeria a pena, no final das contas, negar-lhe? Ela adivinhava. Quero ver o mar, Francisco. Me leva... Agora. Ele tinha lágrimas nos olhos e a voz trêmula quando disse: mas você pode se sentir mal... Pode não fazer bem pra você. Não seria melhor esperarmos que você se sinta melhor? Tenho certeza que... Francisco, eu não vou melhorar. Dessa vez ele não teve forças pra dizer que aquilo era bobagem. Fechou os olhos cansado e deixou as lágrimas correrem livres. Ela pediu de novo: agora. Ele abriu o armário, tirou umas roupas e o par de sapatos vermelhos que ela tinha usado quando chegou ao hospital 20 quilos atrás. Chamou uma enfermeira e foi até a recepção. Pediu para assinar o termo de responsabilidade. A mulher atrás do balcão olhou atônita para ele. Depois sorriu compreendendo. Disse que preparia o termo o mais rápido possível. Então ele voltou ao quarto, ajudou-a a se trocar, a calçar os sapatos vermelhos. Tudo estava largo. As roupas eram irreparavelmente inapropriadas. Mas parecia que ela tinha recuperado algo do brilho dos seus olhos. Agora tão opacos. Ele desceu com ela nos braços, assinou o termo no balcão enquanto as pessoas que passavam observavam assustadas. Então saíram. Duas quadras e já podiam ver o mar. Ele a pousou na areia por um instante enquanto tirava o sapato social. Desabotoou a camisa amassada, enrolou as mangas e a retomou nos braços. Mais próximos da água, voltaram a se sentar. Ela encostada no peito dele. Observando. Sim, agora era um sorriso... E haveria lágrimas de emoção se não se sentisse tão cansada. Sorriu. Sorriu como se ainda fosse aquela menina forte e saudável, dançando pela sala, sapateando no chão os seus sapatos novos de um vermelho vibrante. Ela o olhou por um tempo, agradecida. Por instantes, ele sorriu também despreocupado. Ficaram assim abraçados por muito tempo olhando o mar.
No meio da espuma das ondas quebrando, uma gaivota atrevida pescava. Você viu? Mas ela não respondeu...
Um vendedor ambulante observa um homem na praia chorando abraçado a uma mulher que parece morta.

segunda-feira, novembro 05, 2007

Personagem

A cada golpe eu finjo
que o coração magoado suporta
que os pés feridos de caminhar
aguentam
que o que tenho nos olhos
é poeira
e não lágrima
que a amargura da voz é cansaço.
E não
solidão.

sábado, novembro 03, 2007

Não

Eu exigi de você
as palavras que eu queria ouvir.
Levei muito tempo pra entender
que o seu silêncio negava
aquilo que eu pedia.

quarta-feira, outubro 24, 2007

domingo, outubro 21, 2007

quarta-feira, outubro 17, 2007

Balanço

Restaram
estas flores desbotadas
o plástico duro das retinas
esses papéis de bala
amassados pelo chão.
Restou um cheiro
misturado
de perfume
excitação
cigarro
bebida.
(E estes paetês espalhados aí pelo chão)

Só Agora Entendi...

Não sou eu que sou triste.
É uma tristeza
que mora
dentro de mim.

Hino de Passagem

As coisas que passaram continuam
impávidas.
As coisas que passaram
resistem.
As coisas que passaram ainda me choram.
Choro as mesmas lágrimas.
Nada modifica.
As coisas que passaram não se importam:
só eu sofro ainda.

sexta-feira, outubro 12, 2007

A Rosa

Perdoa estas mãos vazias, amigo.
As flores que colhi para ti
não suportaram a espera.
O tempo se encarregou de murchá-las:
não a esperança.
Devagar retomo:
reencontros
abraços
lágrimas de partida que agora é chegada.
Perdoa estas mãos vazias.
(Nelas estavam as rosas)

domingo, outubro 07, 2007

Às palavras que não foram ditas, acrescento estas...

É com silêncio que pretendes retribuir todas as minhas afirmações?...
Eu já muito disse do que passou e do que se deixou ficar.
Agora
tudo me cansa:
teu silêncio de pedra
que apesar das palavras não diz;
esses nós que deixamos sem desatar pelo caminho.
Já não sei se esqueço
se averiguo
voltando de tempos em tempos a cabeça para trás.
Os nós vão sumindo
distantes.
Distante também essa lembrança
de nós
de ti.
Como se sobrasse apenas um vago desejo
de que não tivesse sido bem assim...

quarta-feira, setembro 19, 2007

Viagem

II

Sento ao lado de um homem que lê no ônibus. Vejo as árvores correndo lá fora e tento disfarçar. Corre um vento levemente gelado por estes dias, encontrando meu rosto molhado de lágrimas. Tento em vão enxugá-las passando as mãos no rosto e secando-as no vestido já úmido. Tento rir do ridículo da minha situação: o vestido de flores miudinhas que não gosto mas uso porque ganhei, eu só no meio daquela multidão de gente voltando pra casa, sem conseguir conter o choro. O homem ao meu lado lê concentrado. E me pego torcendo que alguém me veja, mesmo ele e faça algo por mim. Tenho a sensação de que ao chegar no ponto onde devo descer não terei forças. Ele parece voltar o rosto em minha direção... Mas não... terá sido apenas uma impressão. Volta à leitura. Certamente, se eu soluçar ele há de confundir o meu choro com alguma personagem do livro e há de estar surdo para o meu desespero. Sinto que não terei forças... Tento me acalmar e, por alguns breves minutos, consigo conter o choro. Mas, ao virar de uma esquina, sem motivo nenhum, ao respirar mais profundamente como para me refazer dessa tristeza sufocante eis que o suspiro relembra a dor e já não posso conter as lágrimas de novo. Amanhã terei os olhos inchados, o rosto abatido. Tenho vergonha, já não sei como disfarçar... De súbito percebo que quase passei do ponto, levanto bruscamente e agradeço que tenha sido assim - não sabia que teria forças pra me levantar. Desço os degraus com as pernas um pouco fracas, vacilando, e ando a passos largos para casa. Abro a porta, atiro a roupa pelo corredor e me meto num banho bem quente. Exausta, me deixo ajoelhar e sento sobre os calcanhares no chão gelado do boxe... Tenho um fim de semana inteiro pela frente, sozinha neste apartamento e sei que o telefone não há de tocar, seguindo religiosamente sua mudez das últimas semanas. Afogo entre a água do chuveiro e o pranto: apenas os azulejos me escutam.

terça-feira, setembro 18, 2007

Respostas

Estou só.
Aprendi a ter como companhia
apenas a luz do dia e a escuridão da noite.
Chamei. Pedi.
Ninguém veio.
Implorei. Desesperei.
E Deus não existiu.
Agora
que a seca estia
e posso, mesmo daqui,
ver algumas flores raras no jardim
é que vão chegando a mim algumas vozes.
Murmúrios.
Mantenho as portas fechadas.
Não responderei.
Apenas a quem me pedir auxílio
hei de socorrer:
por compaixão de mim mesmo.

sexta-feira, setembro 14, 2007

Reagente

Anda silenciosamente.
Sem rumo.
Responde apenas quando alguém chama.
Não chama.
Não pede.
Não implora.
Um dia
quando se cansar de só re-agir
pode ser que ninguém responda.

terça-feira, agosto 28, 2007

Viagem

Sento perto da janela, uma brisa levemente fria invade a brechinha aberta.
Abro o livro com cuidado acariaciando as palavras. A menina senta ao meu lado de olhos úmidos. Repetidas vezes enxuga o rosto com as mãos, depois as mãos no vestido, nervosamente. Eu investigo com o canto dos olhos: a menina chora. Por um tempo, desconcertado, miro inutilmente as palavras que vão se embaralhando na página branca do livro. Quero dizer alguma coisa, não que a conforte, mas que a distraia ou pelo menos a faça se sentir menos só. Olho de novo, de soslaio. Hesito. Por baixo das lágrimas o rosto bonito da menina me faz pensar... Certamente, há de achar que tenho cá comigo outras intenções que não a de consolá-la mesmo que momentaneamente. Certamente não há de perceber no abatimento recente do meu rosto, nestas rugas novas, toda a solidão que tenho passado nos últimos meses. Não há de ler no meu rosto a vontade de impedir que alguém se sinta como eu me senti há tempos atrás, chorando só no ônibus de volta pra casa e dando desculpas esfarrapadas para os nós do meu rosto a cada dia no trabalho: dormi mal, ando tendo noites de insônia, dormi muito, vi um filme, sai e voltei tarde para casa - mentiras cotidianas. A ninguém eu pude ser sincero e dizer: sofro. Apenas isso. É isso que crispa o meu rosto, é isto que me tornou em tão pouco tempo esse novo ancião. E por mais que o tempo vá curando os males, não desfaz estas marcas. Não... A menina ao meu lado não haveria de ter sofrido o bastante em sua recente existência para entender o meu sofrimento ao vê-la sofrendo. Talvez ela mudasse de assento. Talvez descesse do ônibus desesperada. Achei melhor me calar. Mas a repetição de seus gestos me atingia em cheio: eu não conseguia ler. Depois de muitas curvas, de muitas vezes ter passado as costas das mãos no rosto e muitas vezes tê-las enxugado no vestido - eu já lembrando da sensação da roupa úmida de solidão - ela se acalmou. Consegui ler algumas linhas no meu momento de egoísmo ou auto-defesa... não sei. Olhei de novo e vi os cílios unidos de lágrimas. Não pude. Baixei os olhos, depois olhei pra janela tentando evitar que eu também chorasse. Logo depois, ela levantou e desceu. Num ponto qualquer, num espaço qualquer entre o lugar que trabalho e o lugar que eu moro. E eu voltei, vencido, cansado, para casa. Acendi a luz do apartamento, bebi um gole de água. E requentei de novo aquele resto de solidão.

sexta-feira, agosto 17, 2007

Inverno

Invade os meus ouvidos
uma enxurrada de palavras
que não entendo.
Não distingo
na expressão das faces
dessa gente
o que querem dizer.
Nada do que me dizem faz sentido.
Ou pouco importa.
Repetem
mecanicamente
gestos e palavras vazios.
Tudo me enfastia
essa falta de licença
pra sentir o que sinto
pra me trancar no silêncio destes dias.
E este sol criminoso
colorindo esses dias tristes...

segunda-feira, agosto 13, 2007

Leve

Havia uma súplica muda em mim para que você ficasse.
Você olhou bem nos meus olhos como quem não compreende aquilo que não é dito.
E então partiu...

terça-feira, julho 24, 2007

Noite de Autógrafos

Para Chacal
Ave poeta
com teus olhos coloridos de céu.
Teus cabelos grisalhos de nuvem.
Tuas mãos repletas de palavras
teu sorriso.
Ave poeta.
Feliz com seu primeiro livro que fica de pé.
Outros virão.
E hão de caminhar sozinhos...

sexta-feira, julho 13, 2007

Janelas

Eu quis um novo rumo. Quis construir um caminho que visitasse os lugares onde nunca estive. Quis uma nova receita de sabores desconhecidos. Uma mistura de temperos inesperados. Quis andar com os pés descalços sobre a pedra aquecida de sol. Quis deixar o sol entrar. Abri todas as janelas da casa. E as janelas da alma. Havia algo por dentro que precisava desembolorar.
Se desembolorar fosse possível... Caso contrário, eu haveria de carregar aquele resquício comigo.
Não há de ser nada, pensei - tudo o que somos são resquícios.

segunda-feira, julho 09, 2007

Des-Cisão

"E eu que nunca amei a ninguém
Pude então, enfim amar"


Volta então
que o caminho é longo...
Começa agora a caminhada.
Há de demorar
o tempo de aprender de novo
o sabor do beijo
a delicadeza das palavras
e gestos novos.
Porque há de ser necessário reinventar os gestos
até o extremo de desaprender o que é antigo.
Será imprescindível
armar um circo todas as tardes mornas de domingo
para aquecer aquilo que não pode ser
esquecido.
Constrói de novo um castelo
onde seja possível proteger
da chuva e das tempestades.
Aprende novos passos
desta mesma dança.
E dança.
Como nunca fizeste.
Volta.
Mas coloca pé ante pé
a tua decisão.
Avança cada centímetro
de reconquista
confiança
e sabores renovados.
Volta.
Começa agora a caminhada.
Porque há de ser preciso
reconstruir os caminhos.

quinta-feira, julho 05, 2007

Casulo

Não era aqui que as palavras moravam...
Antes de tudo
antes de mim.
Era em algum lugar mais distante que o tempo
mais insípido que as lembranças.
Era lá que elas apareciam.
E aqui,
sem querer,
se desnudaram.
Como se fora o avesso
do que deveria ser.
E assim se formaram
impávidas.
Sobrevivemos.
Havíamos de sobreviver.
Foi para isso que as palavras vieram:
para contar.

sexta-feira, junho 15, 2007

Inventário

Houve um tempo em que não havia abismos.
E eu podia transitar entre o meu universo e o seu sem sustos...

Sereno

Eu caminho pelos lugares onde estivemos.
As coisas não sentem falta de nós.
Tudo permanece.
Eu caminho
e finjo que não percebo
a intocável quietude das coisas...
Nada as demove:
só eu sinto a tua falta.

sexta-feira, junho 08, 2007

"Nem é preciso dizer que está muito bonito" *

A platéia interrompe as músicas aplaudindo.
"Ana Júlia" é acompanhada com entusiasmo como se não fosse preterida.
Amarante erra a letra de "Do Sétimo Andar" e a gente aplaude.
O show é triste e feliz ao mesmo tempo. Camelo se declara para o público carioca.
O que mais eu posso dizer sobre essa noite?
Que cantei até gastar a voz, pulei feito uma louca e tinha ao meu lado pessoas que eu amo mais que tudo em minha vida...

* Rodrigo Amarante sobre o show que a platéia deu durante a primeira noite de despedida do Los Hermanos na Fundição Progresso.

Voltas

E eu quis
numa curva qualquer
atirar-me.
Mas o tempo
deu voltas
nas voltas
do meu intento.
E agora
acordo-me assim
de novo
de volta
antes
de mim.

domingo, junho 03, 2007

Palavras Apenas

Ela guardou consigo aquelas poucas frases que ele tinha dito:
"Você fica bem de vermelho", "Gosto das suas unhas sem esmalte".
E, às vezes, quando apertava uma saudade qualquer, sorrateira, ela se esforçava por lembrar mais do que aquelas frases tão simples... Algo que dissesse mais. Mas não podia lembrar - tinham se dito tão pouco...
Então repassava as mesmas frases para si mesma...

"Você fica bem de vermelho" era a sua preferida...

sexta-feira, junho 01, 2007

You Are My Sister

You are my sister, we were born
So innocent, so full of need
There were times we were friends but times I was so cruel
Each night I'd ask for you to watch me as I sleep
I was so afraid of the night
You seemed to move through the places that I feared
You lived inside my world so softly
Protected only by the kindness of your nature
You are my sister
And I love you
May all of your dreams come true
We felt so differently then
So similar over the years
The way we laugh the way we experience pain
So many memories
But theres nothing left to gain from remembering
Faces and worlds that no one else will ever know
You are my sister
And I love you
May all of your dreams come true
I want this for you
They're gonna come true (gonna come true)

segunda-feira, maio 28, 2007

sexta-feira, maio 18, 2007

Um Pouco de Mim

"Minha filha, chegou a hora de você ser a sua melhor amiga..."

Uma amiga me explica que está chegando aos 30 e precisa logo arrumar um marido pois quer ter filhos. Explica-me calmamente que não precisa ser um ótimo marido contanto que seja um bom pai (eu me pergunto se é possível um homem se preocupar em ser um bom pai e não em ser um bom marido). Afinal, casamento pode não ser para sempre, ela me diz.
Eu sei. Passo por um grande ruptura (apenas uma?!) agora mesmo. Estou me separando e sei o quanto isso é doloroso. E no meu caso tenho certeza de que está sendo mais fácil do que o normal. Somos amigos, companheiros mesmo... e eu imagino que dificilmente deixaremos de ser.
Lembro-me de que nunca quis casar na igreja - coisa que realmente não fiz - ou com qualquer outro tipo de solenidade.
Primeiro porque casamento é essencialmente um compromisso entre duas pessoas apenas - embora todo mundo tente opinar mais cedo ou mais tarde. Segundo porque eu acho que nunca fui ingênua ou inocente o suficiente para não achar desnecessário esse tipo de coisa (respeito quem pensa diferente).
No meio desse turbilhão de acontecimentos, tive que enfrentar também uma mudança de emprego. Desafios mais altos... E eu estava só porque o homem com quem eu dividi toda a minha vida adulta partia para uma (longa para mim) viagem.
Descubro entre uma tentativa e outra de não passar todos os momentos sozinha, que alguns amigos "considerados em comum" - eu não acredito muito nisso - são apenas amigos dele mesmo... Fogem de quaisquer convites. Aprendo rápido, desisto logo.
Certos aprendizados são dolorosos. Mas muito válidos.
Estou só e mesmo os "meus" amigos parecem ter combinado um período para não terem tempo. Alguns sequer chegam a saber do que se passa, tamanho o meu azar, estão tão sem tempo que respondem logo "vamos demorar a marcar algo por isso e aquilo"... Não podem ler as lágrimas que trago na minha voz.
Por força de alguns acontecimentos - eu diria, no mínimo, inusitados - me distancio de um amigo muito caro para mim... Esse é o momento em que tenho que caminhar só, penso.
Mas... nem tudo são tristezas.
Finalmente estou trabalhando de novo com uns amigos queridos.
O trabalho tem sido motivador...
Além disso, descubro uma força em mim que eu desconhecia. Algo novo que preciso explorar e desenvolver.
Alguns amigos se preocupam na medida do que podem. Nenhum, porém, tem sido realmente presente nestes momentos. Não importa. Aprendo a baixar expectativas com relação a muitas coisas. Além disso, tem sido importante contar apenas comigo mesma.
Em algum ponto de nossas vidas (ou em vários) a gente é capaz de sentir algo que na maior parte do tempo apenas adivinhamos: caminhamos sozinhos. Somos, essencialmente, solitários. E eu retomo o gosto que tinha na adolescência por meus momentos de puro isolamento.
Há alguém que ao voltar pode já não me reconhecer...

Essa frase aí em cima foi generosamente compartilhada comigo por alguém que passou por algo semelhante. E que teve a felicidade de contar com uma mãe sábia o suficiente para dizê-la assim tão simplesmente.

sexta-feira, maio 11, 2007

Plural

Todos os nomes me cabem -
os raros
e os cotidianos.
Todas as dores são minhas.
Mas também
todas as alegrias...

quinta-feira, maio 10, 2007

quarta-feira, maio 09, 2007

quinta-feira, maio 03, 2007

Descaminhos

Eu ando por aqui
como quem pertence.
Me empresta um charme qualquer
ver a praia todos os dias.
Não importa o calor que
faz no Rio:
por aqui sempre corre uma brisa
de agasalhar as alegrias
e esconder a tristeza nos olhos.
O sol que se derrama sobre o pão de açúcar
o bondinho despreocupado carregando os turistas...
tudo é tranquilo de se olhar.
O Cristo lá de cima olhando
quando eu chego.
Desço do ônibus e levanto a cabeça
procurando.
Mando um abraço no pensamento.
O dia começa outra vez.

quarta-feira, abril 25, 2007

Pequeno Dicionário das Coisas que Não Serão Ditas

Tudo me cabe neste silêncio:
a ausência de teus gestos
o infinito desta distância
teus olhos quando não me vêem.
Aqui tudo é de partir.
Mesmo aquilo que não chegou a ser.
Todas as solidões me doem -
até o barulho silencia.

sexta-feira, abril 20, 2007

Um dia de cada vez

Estás diante de mim.
És nesse momento simples
e pouco
meu.
Amanhã...
Amanhã será outro dia.

Diferente

Serão iguais a mim?
Com medos e coragens e alegrias histéricas e dores pungentes?
Serão
mesmo
iguais a mim?
Verborrágicos e sorumbáticos
devorados e famintos?
Serão
estes
iguais a mim?...

Infinitesimalmente *

Urge ver-te. E não -
o tempo será curto.
Mesmo com todos os infinitos.

* Eu roubei esse título. Acho que estou virando marginal... :)

domingo, abril 15, 2007

Núcleo

Nada disso me modifica.
Há algo em mim que permanece.
Durante tempestades e bonanças...
É isto
o que me define?
Este algo que percorre em mim as mudanças
que se me impoem?
Há algo mais.
Além do que posso compreender.

Transitório

Já não era mais o mesmo.
Nem era outro...

domingo, abril 08, 2007

terça-feira, abril 03, 2007

Tudo ao Mesmo Tempo Agora

Gente,
só para contar que esse ano começou como nenhum outro. Mil mudanças acontecendo e algumas nem compartilhei com vocês...
Uma delas, muito boa, é que saiu a antologia de poemas para a qual fui convidada... Chama-se "Labirinto de Espelhos" e foi lançada pela editora De Leon. Estou enviando o livro para uma Clara Vasconcelos - portuguesa - que me mandou um email carinhoso há tempos perguntando em que livro estava publicado um poema meu que ela gostou muito. Era o Bumerangue. Expliquei que não tinha livro publicado mas que talvez saísse a tal antologia e prometi um exemplar caso acontecesse.
O livro está a caminho, Clara, simbolizando muitas pessoas a quem eu gostaria de entregá-lo.
Fiquei sabendo agora mesmo que essa semana vai ter a IV Semana Cultural em Santa. Não percam, tem muita coisa legal...
E por último mas não menos importante: Cissa voltou com seus textos maravilhosos. Confiram, vale a pena!

A Lente

Quero algo que me revele
no curto espaço de um close:
os olhos muito maquiados
como não costumo.
A boca num gesto
sem conclusão.
Quero algo que me revele
uma beleza qualquer
em mim.

segunda-feira, abril 02, 2007

Pronta

Pronto ou não, lá vou eu...
Estarei pronta?
Não um dia
mas agora.
Sem fobias
nem angústias?
O sono roubado rondando-me nas esquinas.
Estarei eu
madura?
Posso afirmar:
esta sou eu!?
O que em mim
me define?
Pergunto-me
até perder-me...
Tecer-me:
esta é minha sina.

quinta-feira, março 22, 2007

Caminhando

Quanto esses passos me levam
a mim?
Caminho por uma rua
onde árvores outonam folhas pelo
chão.
As folhas secas quebram o silêncio gelado
sob meus pés.
Caminho.

Quanto disto me leva
até mim?
Nada responde.
Me perco entre as sombras
que o sol se esconde.
Eu sigo.
Já não posso retornar ao que sou.

terça-feira, março 13, 2007

quinta-feira, março 08, 2007

À Luta

A você que já chorou no banheiro do trabalho porque foi agredida...
A você que é tida como histérica porque reclama seus direitos.
A você que tem que se desdobrar em mil e fazer tudo perfeito porque não teve "a sorte" de ter nascido homem.
A você que realmente sabe que hoje é um dia de luta e não de flores.
A você...
Parabéns.

E aos homens da minha vida que me acostumam pessimamente, fazendo-me acreditar que dias melhores virão.

quarta-feira, fevereiro 28, 2007

Fantasias

Desfilam bailarinas perto de mim. As sapatilhas de ponta no asfalto.
Fadas tecem feitiços. Sacam o pó de pirlimpimpim e ele se confunde com os confetes.
Passam palhaços afoitos. O sorriso marcado no rosto, mesmo quando a boca não sorri.
Enfim... desfilam: borboletas, piratas, sacis.
No fim da noite, restam a fantasia sobre o sofá, os confetes pelo chão da casa. A serpentina enrolada na antena da tv.
Uma mágica momentânea findou.
Não será o último dia do tempo.
Outros carnavais virão.

quarta-feira, fevereiro 21, 2007

O Bloco

Ando na mão oposta. Contra o bloco. Contra a corrente de foliões.
Tudo desliza sob a chuva fina. Alguém grita ao longe. Não entendo. Dinheiro, cabeleira, Zezé.
O som vai se abafando em meus ouvidos. Porque rumo contra.
Contra a maré de alegria, contra a massa enlouquecida, contra os ambulantes e toda essa tralha gelada, o gelo potável do isopor.
Tento avançar. Esse nada me detém. Aqui não há espaço para o que é triste, devagar, sombrio.
Acho alguém na multidão. Quero salvar-me, achar-me nessas ruas estreitas de paralelepípedos escorregadios.
A chuva nos protege.
De repente, o bloco faz a curva e me vejo só no largo. Debruço nas grades aliviado.
Desorientado. Mas a salvo.

segunda-feira, fevereiro 19, 2007

Postal

Desenhou um sol com um sorriso atrás do cartão postal.
Não sabia mais o que dizer...

Síntese

Tudo isto sou eu.
Estas contradições despedaçadas
este sorriso
esta lágrima.

Este sim
e este não.

Carnaval

Os foliões atravessam
a avenida.
Bate-bolas, bailarinas, palhaços
desfilam alegrias.
Chove confete e serpentina.
A bateria
não abafa as batidas
aqui de dentro.

segunda-feira, janeiro 29, 2007

(Des)construir-me

Levei todo esse tempo construindo isto que eu achava que era.
De repente, reparo que não caibo em mim.
Selecionei cuidadosamente
tijolo por tijolo
disso que não sou.
Urge desconstruir-me.
Juntar mais livremente as peças
dessa contradição que (me) revelo.

sábado, janeiro 27, 2007

Ficção

Procuro um livro vermelho.
As prateleiras se calam.
Tudo é silencioso entre os livros...
Me perco entre as páginas
de vidas e vidas
não vividas.

segunda-feira, janeiro 22, 2007

sábado, janeiro 20, 2007

sexta-feira, janeiro 12, 2007

Em Breve

Em breve estarei forte de novo.
Em breve
estarei transbordante de palavras.
E histórias.
Em breve, serei
a dona da história.
De todas as histórias
que eu ainda puder inventar.

Em breve
te direi uma só palavra.
Aquela que esperas.
Em breve.
Muito em breve.

terça-feira, janeiro 02, 2007

Emudece

As palavras silenciam em tua boca.
Tudo emudece.
Tens medo
eu sei.
Também o sinto.
Mas solto as palavras
fio a fio
do pensamento.
Ouves calado.
Surpreende-te.
Assim é.
Tudo isso que dizes já conhecer.
Mesmo assim, surpreende-te.
Cala-te.
Tudo em ti silencia.